sábado, 2 de agosto de 2008

O PCP na Assembleia da República questionou o Governo em 30/07/08 sobre a reiterada violação do direito à greve na CP

Destinatário: Ministério das Obras Públicas, Transportes e
Comunicações

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República

A CP assumiu desde há dois anos a prática de considerar todas as greves ilegais. Não só tem vindo a marcar falta injustificada a todos os trabalhadores em greve como chega ao ponto de alargar a falta injustificada para os dias de folga quando consecutivos ao dia de greve.

Perante a morosidade dos processos em tribunal, a cumplicidade do Governo e a passividade da Inspecção Geral do Trabalho (agora ACT), os trabalhadores da CP viram-se obrigados a suportar um, dois, três ou mesmo quatro dias de faltas injustificadas por cada dia de greve, com as respectivas perdas salariais.

A desfaçatez do Conselho de Gerência da CP é tal que na última greve dos maquinistas, na acta da revisão do AE que resultou da luta, pode-se ler a seguinte passagem: «Greve promovida pelo SMAQ entre 6 e 12 de Junho de 2008: Atenta a prática do SMAQ no que respeita ao cumprimento da obrigação legal de apresentação de proposta de serviços mínimos a observar durante a greve, a Empresa compromete-se, excepcionalmente, a não qualificar como faltas injustificadas as ausências no período em questão, a título de greve, e a não extrair os efeitos destas» (sublinhado nosso).

A 7 de Julho deste ano, o Tribunal da Relação de Évora deu razão ao processo instaurado pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores do Sector Ferroviário (SNTSF) referente a situações ocorridas entre 2004 e 2006. O Tribunal condenou a CP a pagar quantias entre 33 e 99 Euros aos seis trabalhadores que corporizaram este processo, considerou legais as quatro greves em causa e obrigou a CP a retirar do cadastro a inscrição destas faltas como faltas injustificadas.

Nesse mesmo acórdão, o Tribunal explicita: «No contexto de uma luta laboral como é uma greve, a posição assumida pelo Sindicato recorrente, no que toca aos serviços mínimos, é assim de considerar aceitável e conforme à lei. O que não seria razoável, num Estado de Direito democrático como o nosso, seria admitir que o exercício de um direito fundamental dos trabalhadores, garantido pela Constituição, pudesse ver-se desproporcionalmente limitado por força duma via interpretativa tão restritiva, que na prática desvirtuasse o sentido de uma norma apenas respeitante às formalidades do aviso prévio da greve».

O citado extracto do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora é de uma clareza suficiente para evidenciar a situação que se vive na CP, empresa pública tutelada pelo Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações. Resta apenas ao Governo demonstrar qual é a sua própria concepção de Estado de Direito.

Assim, ao abrigo do disposto na alínea d) do Artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e em aplicação da alínea d), do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, pergunto ao Governo, através do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, o seguinte:
1. Considera o Governo que seja próprio de um Estado de Direito que os trabalhadores da CP para exercerem um direito constitucional como o direito à greve tenham que recorrer a tribunal para que (anos depois) sejam reconhecidos os seus direitos?

2. O Governo caucionou a prática da CP de negar o direito à greve? Se sim, com que fundamento? Se não, que medidas tomou ou vai tomar junto do Conselho de Gerência da empresa?

3. Vai o Governo dar orientações para que esta situação de reiterada ilegalidade na CP seja imediatamente corrigida? Ou vai continuar a apoiar esta posição do Conselho de Gerência, que obriga todos os trabalhadores vítimas desta prática a recorrer sistematicamente aos tribunais?

Palácio de S. Bento, 30 de Julho de 2008
O Deputado:
Bruno Dias